E quando o cume da Agulha do Diabo vem de bônus!!!

Por webmaster

Agulha do Diabo (2.050m), Parque Nacional da Serra dos Órgãos (PARNASO)
Via da Conquista, 1941 | 3° IIIsup A1 C E2 D4
Guia: Miguel Freitas | Participante: Renata Jiamelaro
Equipos utilizados: corda de 60 metros e 8 costuras (acho) 38 1500

Meu 3 de julho, estava definido já há cerca de 1 mês, quando o Adrian Giassone abriu a prancheta para o Mirante do Inferno, com linda vista para a imponente Agulha do Diabo. Estava empolgadíssima com a idéia de poder contemplar esta incrível montanha tão de perto.

Aí que no início da noite de sábado, Miguel Freitas ainda estava sem parceria pra escalar a imponente Agulha na manhã seguinte. Eu fiquei inconformada por ele (haha). Miguel tentando aqui, alí... e eu solto um “se eu desse conta, eu iria!” Perguntei por fulano, ciclano... ele tentando convencer alguém e nada.... tentei ajudar perguntando se iam mesmo deixar passar esta oportunidade?!? E fui ficando cada vez mais com aquela vontade despretensiosa de “eu quero” (talvez quando eu “crescer”...). Aí que Miguel diz: “Renata, você faz... mas tem que ir mais rápido do que Cabeça de Peixe (que foi mega pesado). Se estiver disposta....” Havíamos feito o Cabeça de Peixe há poucas semanas e se ele falou que eu faço foi baseado no que viu.... vai ser mega pesado nível 2... Mas bora apertar o passo então e encarar! Se eu já estava com vontade, após ter realmente a chance, ficou irresistível a idéia! Não tinha como não ir... “Kmommm e kospés!” :)

2 M 830Fomos num bate-volta saindo cedinho do Rio (horários no final). Quase entrando no parque, avistamos aquele filetinho de lua linda bem sutil no céu, a primeira vista especial do dia. Chegamos às 6 em ponto na portaria, entregamos os comprovantes de ingresso comprados pela internet e o termo assinado. Iniciamos a trilha sentido Pedra do Sino às 6:30, Teresópolis estava coberta por um lindo mar de nuvens e a vista dos cumes da serra era inspiradora com aquele céu azul. Nunca havia entrado no parque por este lado, achei as paisagens impressionantes de tão lindas, um verde exuberante, muitas montanhas e paredões rochosos.


5Caminhamos sentido Sino e então pegamos a trilha do Paredão Paraguaio sentido Mirante do Inferno, chamada Caminho das Orquídeas, de lá tem-se uma linda vista para a Serra dos Órgãos. Dava pra ver perfeitamente a Verruga do Frade, o Morro do São João, o Morro da Cruz e a pontinha da Agulha do Diabo. Mais adiante descemos o Vale do Paquequer, uma grota de um leito de um rio seco, nascente do Rio Paquequer. Neste trecho, além de fria, a trilha fica escura, bem úmida, escorregadia em alguns pontos e com pequenos trechos de lama. Também tem uns buracões fundos que é preciso estar atento.

Após 3h45m de trilha com pequenas paradas rápidas para recuperar o folego, chegamos na base da via. Lá já havia uma cordada tripla e pra nossa sorte um deles desistiu logo no primeiro esticão e então os outros 2 tocaram em boa velocidade, ambos estavam lá pela primeira vez.

O Miguel entrou na via por volta de 10:40, deixou claro que não podíamos demorar muito na escalada e pra não perder muito tempo estudando os lances difíceis, pra roubar se necessário (segui o conselho hehe). Fui confiando totalmente no “você faz” que o Miguel disse. Como fechamos a escalada no sábado a noite, não tive tempo de olhar grau e nem ler absolutamente nada sobre a escalada ou o que estava envolvido (foi ótimo no meu caso, evitou que eu prejudicasse meu psicológico por antecipação). Fui confiante, cheia de coragem e animadíssima (embora tenha em mente que o ideal é sempre olhar o croqui da via, em especial numa escalada como esta, com lances que podem comprometer a escalada).

Basicamente a escalada não é difícil, mas bem cansativa e bastante exposta em alguns trechos, exigindo bastante fisicamente (devido a longa caminhada – aprox. 12km a partir da barragem - em passo bem acelerado) e bom psicológico do guia. A escalada também permite boa comunicação o tempo todo, o que me deixou bem tranquila do começo ao fim.

Entrei na via já meio cansada e sentindo as coxas já doloridas do trepa-pedras pra chegar na base. O 1º esticão começa num diedro que você sobe entalando o pé e mão esquerdos. Do 2º pro 3º grampo, após fazer o lance, o Miguel já rebocou de cara minha mochila que atrapalharia bastante na hora de passar meio em chaminé, foi ótimo e ajudou muito.

No 2º esticão, a via segue numa longa travessia e depois com uma horizontal com friso para os pés que vai acabando à direita e então é preciso desescalar um pequeno trecho bem sujo para alcançar o platô logo abaixo. O Miguel teve a impressão que este platô cedeu um pouco e como este trecho estava sujo, ele preferiu esticar um pouco mais à direita utilizando duas agarras de mão (a segunda meio esquisita) e então pular para o curto platô que desbarrancava à esquerda para então seguir adiante passando por uma árvore. Eu tive que fazer igual, não senti muita firmeza em ter que segurar naquelas agarras e pular... pensei em pular direto do friso pro platô, considerei ir por cima (Miguel disse que não seria boa idéia), hesitei bastante em esticar naquelas agarras e pular, mas sem alternativas e com o Miguel sendo bem incisivo com um “é por aí Renata, pula logo!”, me forcei a pular mesmo não gostando muito da idéia... nesta hora ralei de leve o cotovelo esquerdo mas sobrevivi! hehe

No 3º esticão a parte de esforço da escalada já começa, dependendo de como for guiado. Miguel subiu o diedro em técnica de chaminé até alcançar o friso horizontal (pra onde rebocamos as duas mochilas) para então seguir ao platô à esquerda. Não utilizou nenhum móvel, foi direto, num lance bem delicado e eu bem atenta na segurança. Eu subi um pouco diferente com corda de cima, fui bordeando a fenda até o final, que dá quase na horizontal já e utilizei a técnica de chaminé num pedacinho. Foi fácil e sem dificuldade.

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Depois da P4 (dupla – na verdade fizemos a parada um pouco antes da travessia horizontal) seguimos numa trilhazinha até o colo do Diabinho. Na entrada da grutinha, pouco antes de entrar na chaminé do L, fizemos uma boa parada para almoço ao meio-dia.

Finalmente chegamos à primeira chaminé da via, a chaminé do L. Começava a parte “com emoção” da escalada! :) Lembro que fiquei bastante extasiada por estar lá e pelo lindíssimo visual que tínhamos de dentro pra fora da chaminé e por estar diante de minha primeira chaminé de verdade! rs (havia tido uma pequena experiência na Bira, em Itatiaia e outra na XV de Novembro – Agulhinha da Gávea, que deu pra sentir um gostinho melhor). Sua altura impressionou (sem saber que a outra chaminé seria ainda mais impressionante). Não tive medo, achei incrível tudo aquilo e me senti privilegiada, num daqueles momentos de gratidão por estar alí.

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Miguel tocou rebocando a mochila no baudrier e então era minha vez. Achei bem ruim conseguir subir com a mochila pendurada daquele jeito, tentei subi-la primeiro, acomodá-la melhor e então percebi que não teria jeito, tinha que subir com o peso dela no meio das pernas mesmo (me puxando pra baixo) achei muito ruim, mas após algumas tentativas, peguei o jeito e toquei até a pedra entalada. Miguel me instruiu aos próximos passos, abri uma pequena tesoura e segui adiante até chegar a ele. No final da chaminé tive também minha primeira experiência fazendo um pequeno artificial. Foi tranquilo.

24Fizemos então a trilha até o platô da unha. Os últimos esticões são os mais expostos e com lances aéreos, do cavalinho em diante fizemos sem as mochilas, levando somente o necessário para o cume. Chegamos ao platô da unha para entrar no cavalinho no mesmo momento em que o Adrian e a galerinha da caminhada chegavam ao Mirante do Inferno (foi muito legal vê-los lá!), acenamos e demos sequência na escalada. Miguel mencionou como alguns fazem o lance do cavalinho pelo modo tradicional e me explicou direitinho como ele o faria antes de seguir na guiada. Usou uma fita longa pra eu ficar confortável dando segurança a partir do platô e então entrou no cavalinho deitado de costas, reforçou que eu ficaria com meio corpo pra dentro e meio pra fora, que os movimentos seriam pequenos e que ao terminar, já estaria posicionada para a chaminé da unha. O Miguel costurou no primeiro grampo deste esticão que fica no meio da chaminé e seguiu pouco depois de mencionar que aquele era o trecho mais crucial da guiada. Chegando ao topo da unha, sentou, armou minha segurança e me chamou.

A saída para entrar no cavalinho pode ser delicada e exposta também para o participante, não lembro bem como fiz, lembro de ter segurado o grampo com a mão esquerda e depois acho que levantei a perna direita até a fissura do cavalinho e já fui logo tratando de enfiar o lado direito do corpo na pedra, e então usei a perna esquerda como apoio para subir. Me entalei tanto, que as fivelas do baudrier enroscavam na parte de cima da pedra e eu não conseguia sair do lugar. Pedi pro Miguel afrouxar um pouquinho a segurança pra eu poder sair um pouco e então conseguir seguir adiante, os movimentos possíveis eram bem curtinhos. Senti uma forte dor no pescoço devido ao peso da cabeça naquela posição aérea de abdominal, tive que parar e apoiá-la na pedra por uns segundos pra descansar e então segui. A entrada na chaminé naquela posição foi tranquila, o difícil e quase impossível foi conseguir subir a chaminé (aprox. 30 metros) que começa muito estreita. Tentei de diversas formas (lembrei das joelheiras que não tinha), o esforço foi absurdo aqui. Exausta, pensei em ir de batman mas também não tinha espaço pra subir... Miguel botando pressão, eu estava extremamente cansada, mas continuava tentando de todas as formas até que fui subindo bem aos pouquinhos, escorregando e subindo até que a dita cuja da chaminé foi finalmente alargando e eu fui cabendo melhor alí, os movimentos ficaram então mais fáceis e apesar do cansaço extremo consegui seguir mais rápido e facilmente, descosturei o grampo e o Miguel me orientou a continuar subindo agora de frente pra Agulha pois haveriam umas agarras pra apoiar os pés do outro lado.

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Chegar no topo da unha depois de todo aquele esforço, foi uma grande conquista, a paisagem é lindíssima e estamos completamente aéreos neste ponto da escalada. A cordada da nossa frente estava descendo e houve um pequeno congestionamento naquele pequeno espaço. Miguel perguntou se eu queria continuar e sem hesitar nem um pouco, disse um “vamos!” cheia de convicção, em nenhum momento da escalada pensei em desistir, não seria alí a pouquíssimos metros do cume. Miguel seguiu pelo cabo de aço e alcançou o cume às 2 da tarde.

Esperei o cara da outra cordada descer e então subi pela exposta e incrível aresta da Agulha em via ferrata. O medo até tentou se aproximar de leve, mas a garra e o foco rumo ao cume mais incrível da minha vida eram MUITO maiores. A parte vertical da aresta foi o trecho mais difícil e onde se faz mais força com os braços, neste trecho tive dificuldade para passar a solteira de uma fixação pra outra, não alcançava e em etapas consegui passar a solteira pra cima (alternar 2 solteiras ajudaria) e então com mais algumas passadas o cume era NOSSO! Miguel me esperava pronto pra registrar o momento.

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Paisagem incrível do pequeno cume: 360 graus de um dia lindo com aquele céu aberto e azul perfeito. Livro de cume assinado e então preparar para o rapel. Além do back-up, solteira no cabo de aço pra reforçar a segurança e não pendular. Rapel meio negativo por fora da unha até o platô. Hesitei um pouco mas fui, nos demais negativos fui mais tranquila até chegarmos na base da via. Foram 5 rapéis. No último rapel, uns passarinhos lindos azuis e verdes sobrevoavam uma árvore bem próxima naquela imensidão da Natureza, não pude deixar de admirá-los e agradecer por aquele dia incrível vivendo a vida.

O Miguel guiou tudo com muito domínio e facilidade, embora em alguns trechos o esforço inevitável e cansaço eram visíveis. Guiou a via sem nenhum móvel, só me dei conta que poderia ter usado após ver os croquis. Carregou a corda e todas as ferragens durante TODO o trajeto (sabia que se não fosse assim, talvez não faríamos em tempo suficiente para completar a atividade, disse que queria me ver “serelepe”). Mandou MUITÍSSIMO bem! Fica a minha admiração pela guiada e excelente preparo e o meu MUITO obrigada pelo voto de confiança, assunção de risco (por talvez não completar a escalada) e em especial pelo super incentivo em me levar nesta super escalada, onde fiz pela primeira vez chaminés de verdade, um trechinho de artificial e rapéis negativos (onde meu psicológico ainda pega um pouco... nem chiei do segundo em diante :p rs)

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Fui bem leve, somente com o essencial. Um litro de água dá legal (no inverno) pra chegar até o ponto de abastecimento de água. Joelheiras em especial pra segunda chaminé, podem ajudar e talvez luvas para o cabo de aço facilitem. O cabo esta em boas condições e sem farpas.

Obrigada ao Henrique pelas fotos no cavalinho. Com o congestionamento no topo da unha e minha demora pra conseguir subir a chaminé, infelizmente não puderam nos esperar para as fotos no cume, a deixa pra ter que voltar :D

O dia estava lindo, não poderia ter sido melhor! Foi uma emocionante surpresa receber o bônus (nunca pensei em fazê-la) de uma escalada clássica e incrível rumo ao cume da Agulha do Diabo, considerada uma das escaladas mais lindas do mundo! Uhuuuu :D

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